A melancolia se transformou em verdadeiro clima de época na passagem da Idade Média para o Renascimento: época da Peste Negra e da caça às bruxas. O sentimento melancólico nascia dessa conjuntura sombria, mas também – paradoxalmente – de novos horizontes abertos nas ciências e na arte. Ao mesmo tempo, uma euforia de especulação comercial tomava conta da Europa. É então que, cruzando o Atlântico, as naus européias chegam ao Brasil trazendo as sementes da melancolia.
Essa é a trajetória reconstruída por Moacyr Scliar em Saturno nos trópicos, livro que incursiona pela literatura, pelas artes plásticas, pela medicina e pela política para traçar um panorama abrangente da história da melancolia e de suas repercussões na cultura brasileira.
A narrativa se desdobra em três momentos: a Antiguidade clássica, a Renascença e o Brasil durante a transição para a modernidade. Scliar fala sobre o rei Saul, sobre anatomia, bruxaria e sífilis, sobre Dürer e Bruegel, Hamlet, Policarpo Quaresma e Jeca Tatu, Cervantes, Machado de Assis, Lima Barreto, Paulo Prado e Clarice Lispector. Seus conhecimentos médicos se unem à habilidade de escritor consagrado: erudição e estilo se completam de forma espirituosa e fluente.
O autor elabora, assim, um painel sobre um tema de grande importância para o entendimento da condição brasileira de hoje. Scliar faz um estudo de fôlego sobre a melancolia européia herdada pelo Brasil – sentimento contra o qual o país lutou e que busca substituir pela esperança.