Com o estilo leve e cativante que lhe é característico, o imortal gaúcho Moacyr Scliar revisita, em A Voz do Poste, temas recorrentes em sua vasta e premiada obra – como a imigração judaica no Brasil e a medicina – para contar a vida de um jovem que ousou acreditar no seu sonho, correr atrás deste ideal e fazê-lo valer a pena, ainda que lutando contra tudo e contra todos. O título é inspirado na trajetória de Maurício Sirotsky Sobrinho, filho de judeu-russos que imigraram para o Brasil, e que se tornou o pioneiro das telecomunicações no Rio Grande do Sul.
Na trama, Scliar apresenta ao leitor a fictícia Santiago do Oeste, no interior gaúcho, onde Josias, o primogênito dos imigrantes judeu-russos Samuel e Raquel, alimenta o desejo de trabalhar numa rádio, como locutor, contrariando os planos do pai de que fosse médico. Sem querer nada com os estudos, o jovem fazia apenas delirar ouvindo as ondas radiofônicas – um desgosto para toda a família, especialmente para Samuel, e que, mal sabia ele, iria metê-lo em grandes confusões.
Josias acaba encontrando, então, o apoio que lhe faltava para alçar novos vôos em seu vizinho, Onofre, que fora justamente dono da única emissora de rádio da cidade. Assim, incentivado pelo amigo que dividia a mesma paixão e entusiasmo pelo rádio, o adolescente dá nova vida a um antigo serviço de alto-falantes, instalados nos postes da praça – mais conhecido pelo povo como a Voz do Poste. Um mergulho corajoso, seguindo seu dom, na carreira radiofônica, apesar da contrariedade, olhar atravessado e cara amarrada de seu pai.
Logo, a Voz do Poste cai no gosto da população santiaguense, tão carente de novidades. Notícias, entrevistas, críticas, receitas, música – uma programação variada que agrada em cheio a todos, menos Samuel. Uma inesperada epidemia de varíola, porém, atravessa o caminho da bem-sucedida – ainda que improvisada – rádio de Josias, que acaba virando joguete de cidadãos raivosos e políticos oportunistas, todos contrários à campanha de vacinação e sabedores do poder de alcance daquele veículo.
Agora, a figura do doutor Bento, chefe do posto médico de Santiago do Oeste, tão admirado por Samuel, estava em xeque, e ainda mais a de Josias, que precisava tomar partido da situação e enfrentar quem quer que fosse em prol do que era correto. Afinal de contas, a sua voz era a Voz do Poste, falando todos os dias para cada cidadão, e, como tal, deveria ser justa, brava, lutadora, regida pelos princípios da retidão, honestidade e verdade. Assim, quem sabe, Josias conseguiria conquistar a atenção e o respeito do único ouvinte que lhe faltava, o mais importante de todos: seu pai.